24 de dezembro de 2012

Trilogia Zeitgeist


A trilogia de documentários Zeitgeist se tornou um fenômeno no YouTube, atualmente com mais de 23 milhões de visualizações no total, e levou seu criador a fundar a organização The Zeitgeist Movement propagando algumas das ideias mostradas nos documentários. Confira neste post se vale a pena assistir a trilogia e algumas ponderações minhas a respeito das ideias nela expostas.

Zeitgeist: The Movie


O primeiro filme da trilogia foi lançado em 2007 e produzido praticamente por uma equipe de um homem só, Peter Joseph, com um orçamento modesto. Você pode conferir uma versão com legendas em português aqui:


Apesar de tudo, a qualidade técnica do documentário é de bom nível, o suficiente para passar a mensagem sem parecer amador ou pretensioso demais. Ele vem até com um guia em PDF mostrando todo o trabalho de pesquisa realizado.

O documentário é dividido em três partes bem delimitadas. A primeira parte ataca o cristianismo e suas origens, mostrando vínculos entre elementos cristãos e elementos mitológicos antigos. Sendo assim, conclui que religiões são apenas fabricações humanas e não devem ser tidas como a verdade suprema.

Na segunda parte, vemos algumas teorias comuns relacionadas aos ataques terroristas em 11 de setembro nos Estados Unidos: o governo teria planejado ou ao menos permitido que os eventos ocorressem, utilizando o mote de guerra ao terrorismo para incitar medo na população e mantê-la sob controle.

A terceira e última parte foca nas questões políticas, sobretudo nas decisões tomadas nos "bastidores do poder" e grandemente influenciadas por grandes banqueiros e empresários. São tidos como exemplos incidentes como o afundamento do RMS Lusitania, que aparentemente deveria ter sido previsto, e o ataque a Pearl Harbor, incitado pelo então presidente Franklin D. Roosevelt.

Particularmente, acho este documentário em grande parte dispensável. É basicamente uma compilação de teorias de conspiração que você encontra por aí na internet, sem acrescentar nada de muito útil. A intenção até pode ser boa, de incitar as pessoas contra as injustiças no mundo, mas não acho que os fins justifiquem os meios a tal ponto que você possa distorcer os fatos e coletar apenas evidências convenientes para comprovar sua tese.

De toda forma, Peter Joseph admitiu que este primeiro filme é totalmente desvinculado da proposta do The Zeitgeist Movement, ao contrário dos próximos dois, então também vou ignorar e fingir que nunca aconteceu.

Zeitgeist: Addendum


Em Zeitgeist: Addendum (2008), Peter Joseph decide avançar além das teorias de conspiração para realizar um processo de problematização propriamente dito, expondo os principais males da sociedade atual e começando a propor algumas soluções. O filme está disponível na íntegra, com opção de legendas em português, aqui:


O filme começa fazendo uma análise e ao mesmo tempo crítica ao sistema monetário dos Estados Unidos - que é basicamente o mesmo da maioria dos países. Ele demonstra, usando um livro distribuído pelo próprio banco central, que o sistema bancário de reservas fracionárias e as políticas monetárias em geral exigem a perpetuação de um ciclo de dívidas que nunca poderão ser pagas e como isso resulta em juros e inflação.

Na segunda parte, o filme se volta um pouco às suas origens de conspiração e entrevista John Perkins, autor do livro "Confissões de um Assassino Econômico". Ele revela como teria supostamente ajudado companhias a subjugar diversos países, contando com a ajuda do governo. Tudo isso seria muito bom, se Perkins fosse uma fonte confiável e não uma contestada por diversos autores e economistas, tornando seu testemunho bem pouco provável.

A terceira parte retoma as preocupações manifestadas na primeira parte e expõe uma alternativa: o Projeto Venus, de Jacques Fresco. Ele propõe uma economia baseada em recursos, focada na produção e distribuição eficiente de recursos por agentes automatizados. De acordo com Fresco, a questão da distribuição de recursos é o principal modo de garantir uma sociedade próspera e não pode ser resolvida com o capitalismo nem política; trata-se de algo puramente técnico.

Por último, resta uma mensagem de mudança através de boicote e educação. O mundo não quer se voltar ao futuro porque seus habitantes continuam na ignorância, mantida por instituições políticas, monetárias e religiosas, e apenas uma revolução social radical pode alterar esse quadro.

Apesar de o documentário não estar livre de teorias de conspiração que não ajudam em nada, desta vez há críticas reais e bastante pertinentes ao mundo em que vivemos, principalmente os aspectos econômicos. A primeira parte, aliás, é uma aula muito bem-vinda de como funcionam os bancos centrais e recomendo a qualquer um.

A falta de uma discussão real sobre a solução apresentada, o Projeto Venus, pode ser decepcionante, mas é explorada com mais detalhes no próximo filme da trilogia. Em Addendum, tem-se basicamente uma propaganda do movimento, sem dizer efetivamente como implementá-la e quais são seus problemas.

Zeitgeist: Moving Forward


A trilogia finaliza-se com Zeitgeist: Moving Forward, lançado em 2011 e destinado a consolidar as ideias apresentadas em Addendum, reforçando principalmente as soluções. Novamente, você pode conferir o documentário com legendas no YouTube:


Zeitgeist: Moving Forward começa com uma verdadeira aula de biologia, a fim de demonstrar que o homem é um produto direto da sociedade em que vive. Diversos especialistas afirmam que, embora os genes tenham um papel importante na pré-disposição do indivíduo a certas condições, é o ambiente que dita se essas condições serão cumpridas ou não. Em suma, uma sociedade doente gera indivíduos doentes.

É nesse gancho que a segunda parte retoma as críticas ao modelo econômico vigente, aumentando as críticas ao sistema monetário e expandindo-as ao mercado financeiro. Desta vez, o documentário não poupa críticas a ninguém, indo desde as teorias de John Locke e Adam Smith até economistas modernos das escolas de Chicago (sobretudo Milton Friedman) e Austríaca, defensores do livre mercado.

A terceira parte volta à ideia de economia baseada em recursos, mas vai além e propõe métodos de implementá-la. O documentário propõe como podemos começar do zero a partir da metodologia científica, distribuindo e produzindo recursos da maneira mais eficiente possível através de mecanismos de rastreamento, transporte, localização etc. Ele também mostra que tecnologias serão úteis e quais serão as melhores formas de produzir energia, destacando principalmente a energia geotérmica.

A conclusão mostra como a situação atual é insustentável e precisa de sérias intervenções para assegurar o progresso e prosperidade da civilização.

Se você estiver disposto a assistir apenas um dos documentários, então que seja Zeitgeist: Moving Forward. Ele representa o nível mais alto de sofisticação das ideias expostas na trilogia, contando com bases razoáveis de argumentação, presença de vários especialistas, discussões sérias a respeito da nossa sociedade e propostas de soluções, além de estar praticamente livre de conspirações malucas.

Há alguns furos consideráveis no modelo de economia proposto, principalmente no que diz respeito à distribuição, mas ao menos o documentário consegue expor o suficiente para abrir espaço ao debate. O mesmo não pode ser dito, infelizmente, das críticas a outras escolas de pensamento econômico: retrata defensores de mercado como não sendo "economistas de verdade" e chega a acusar Friedman de não se importar com o bem-estar social, ignorando totalmente todo e qualquer benefício do livre mercado e mostrando-se fechado a diálogos.

Particularmente, não vejo os defeitos expostos como negativos, pois provocam mais discussão e análises mais profundas sobre o que realmente queremos para o futuro. Uma coisa é certa, contudo: "This shit's got to go". Simplesmente há muita coisa errada para ignorarmos e continuarmos vivendo como se nada de mal fosse acontecer conosco. Nesse sentido, aplaudo a iniciativa de Peter Joseph na trilogia Zeitgeist, e esse é o principal sentimento que deve ser considerado.

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