10 de março de 2012

O que concluir do caso Ecad vs blogs?

(Fonte da imagem)

No post anterior, vimos a preocupante ação do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) na forma de cobrança a blogs que incorporam conteúdo do YouTube. Em um desenlace dramático, o Google Brasil censurou a medida e o escritório assumiu o tal "erro isolado". Mas será que é tão isolado assim? E será que nossa legislação dá recursos para nos defendermos de outras ações abusivas no futuro?

Como funciona a incorporação de vídeos

A primeira coisa que chamou a atenção dos internautas foi a ingênua interpretação por parte do Ecad. Segundo ela, mostrar um vídeo em outra página automaticamente implica em retransmissão, o que mostra uma incrível falta de conhecimento sobre as tecnologias web.

Em primeiro lugar, o que seria a retransmissão? É basicamente pegar uma transmissão e emiti-la em outro lugar. Se você fizer download de um vídeo no YouTube e hospedar em seu servidor, isso sem dúvidas conta como retransmissão.

Acontece que o HTML — a principal linguagem de marcação da web — possui uma tag embed que incorpora um recurso externo à sua página. Mas calma aí. Apesar de usarmos o termo "incorporação", o que o comando faz é única e exclusivamente criar uma referência à página do recurso original.

Um vídeo incorporado ainda está localizado nos servidores do YouTube, é rodado pelo player do YouTube, é autorizado pelo YouTube (desde que o autor do vídeo concorde), e usa todos os recursos do YouTube. Ora, o embed não é nada mais do que uma janela! Não há retransmissão alguma, tudo ainda fica por conta do YouTube.

E, claro, o YouTube já cumpre sua parte da arrecadação ao Ecad.

Os direitos autorais na legislação brasileira

(Fonte da imagem)

A lei responsável pela consolidação da legislação sobre direitos autorais é a Lei Nº 9.610/98. Isso mesmo, 1998. Em um mundo no qual o meio artístico está inevitavelmente ligado às tecnologias da internet, que se alteram a cada instante, temos uma legislação desatualizada há mais de 10 anos.

Por mais que a interpretação do Ecad seja equivocada, o fato é que ela foi possível de ser feita, mesmo sem êxito. Veja como o artigo 5º define retransmissão:

retransmissão - a emissão simultânea da transmissão de uma empresa por outra

Por sua vez, emissão ou transmissão é definida como:

transmissão ou emissão - a difusão de sons ou de sons e imagens, por meio de ondas radioelétricas; sinais de satélite; fio, cabo ou outro condutor; meios óticos ou qualquer outro processo eletromagnético

A partir desses trechos, um leigo em informática provavelmente conclui: "Bom, o blog X faz a difusão de sons e imagens originalmente transmitidos pelo YouTube, então deve ser retransmissão; afinal, uma mesma transmissão não pode feita em dois lugares ao mesmo tempo!".

Mas, como sabemos, não é bem assim. O fato de os recursos serem exibidos tanto na página do blog quanto na página do YouTube é irrelevante, pois o embed é apenas uma janela. De fato, não há uma mesma transmissão em dois lugares diferentes. Há uma única transmissão de um único lugar.

É preciso urgentemente combater essas e outras deficiências graves na milenar legislação brasileira, antes que um Zé da Pamonha se declare o rei da internet.

O passado e futuro do Ecad

Para quem não sabe, essa instituição privada sem fins lucrativos atua na cobrança de obras protegidas por direito autoral, distribuindo os valores arrecadados ao autor. Pois bem, vejamos algumas reportagens referentes ao Ecad e como ele vem cumprindo seus objetivos:

Ecad sob suspeitas de formação de cartel, desvio de função e outras infrações
Por cobrança indevida em um casamento, Ecad é obrigado a indenizar a noiva em R$ 5 mil
Ecad é obrigado a pagar R$ 3,5 milhões a compositor após 30 anos de batalha judicial
Reportagem da ISTOÉ revelando a dissonância entre o Ecad e os próprios artistas

Bem... Tirem suas próprias conclusões. Definitivamente temos várias coisas com que nos preocuparmos no futuro. Mas já que não possuímos controle algum sobre o que vai acontecer, resta-nos o presente.

Fontes

Resposta do Google Brasil à cobrança do Ecad - Terra
Ecad recua, alegando erro isolado - iG
Artigo sobre os acontecimentos - Tecnoblog
Lei Federal Nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998

Um comentário:

  1. Já estava chorando aqui para pagar R$350! aauhuahuhuauh

    Concordo com o ponto de vista do Gabriel, mas tenho outra coisa a acrescentar. Na minha modesta opinião, esse caso não se deu somente por causa de uma interpretação errada.

    Eu simplesmente acho que eles querem é ganhar mais dinheiro. O Brasil possui uma das taxas tributarias do mundo. Nossos impostos são tão absurdos que é mais lucrativo comprar ou produzir algo nos países vizinhos. O pior é que esse dinheiro no fim vai para o bolso dos políticos (ou para a cueca).

    Além de tudo que o Gabriel disse, eu vou dizer só mais um ponto dos videos do youtube. Você escolhe se ele vai ser público ou não. Você tem o poder de impedir que compartilhem ou incorporem. Mas no final, o principal é que você posta no youtube sem a intenção de receber em troca, então concorda em liberar os direitos autorais dos videos.

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